Câncer é hereditário?
O câncer é uma doença que gera muitas dúvidas, seja em pacientes, familiares ou na sociedade como um todo. Uma das principais, que pode até ser identificada como um mito, é se todo câncer é hereditário.
O primeiro ponto a ser esclarecido é a diferença entre doença genética e doença hereditária.
As doenças genéticas são aquelas originadas a partir de uma alteração no material genético (compostos orgânicos responsáveis por carregar informação biológica de cada indivíduo e possibilitar o funcionamento normal das células), seja porque a pessoa já nasceu com essa alteração (o que chamamos de doença congênita) ou porque essa alteração surgiu ao longo da vida por exposição à radiação, infecção, toxinas e outros fatores.
O câncer sempre é uma doença genética e que, na maioria das vezes, é somática, ou seja, a mutação genética está presente em apenas um grupo de células, o que origina o tumor.
Já as doenças hereditárias são aquelas em que existe uma herança que é transmitida através das gerações. Sendo assim elas podem aparecer em outras pessoas da família. E por esse motivo existem os casos de cânceres hereditários.
Câncer hereditário
As síndromes de câncer hereditário são doenças genéticas em que determinados tipos de câncer são mais prevalentes em pessoas de uma mesma família. Nesses casos, as alterações genéticas (o que origina todo tipo câncer) são passadas através das gerações, de pais para filhos.
A maioria tem padrão de herança autossômico dominante (onde a presença da alteração em apenas uma cópia do DNA é capaz de causar a doença), podendo ou não ter sido herdadas de seus pais, mas sempre as pessoas acometidas por essas síndromes tem uma chance de 50% de transmitir a alteração genética aos seus filhos em cada gestação, independente do sexo. A pessoa que carrega a alteração genética tem um risco elevado para desenvolver as neoplasias associadas à síndrome durante toda a vida.
Cerca de 5% a 10% dos tumores são hereditários e mesmo que as chances de desenvolver o câncer sejam muito maiores, essa não é uma relação de 100%.
Tipos mais frequentes
Alguns tipos chamam a atenção por estarem relacionados às formas hereditárias, como câncer de mama triplo negativo, câncer de mama em homens, câncer de ovário, câncer colorretal (com ausência da expressão das proteínas MSH2, MLH1, PMS2 e MSH6), câncer gástrico do tipo difuso e tumores adrenocorticais em crianças.
Ainda podemos citar grupos mais suscetíveis a alguns tumores, como por exemplo o aumento da prevalência do câncer de mama e ovário entre pessoas das comunidades judias Ashkenazi e a população do Sul e Sudeste do Brasil, onde existe mais casos da síndrome de Li-Fraumeni, que aumenta o risco para tumores de partes moles, ósseos, mama, glândulas adrenais e entre outros.
Como identificar as síndromes de câncer hereditário
Em geral, o paciente com diagnóstico de uma síndrome de câncer hereditário tem um acompanhamento diferenciado que busca a identificação precoce de neoplasias relacionadas a essa síndrome. Esses protocolos são específicos para o tipo de alteração genética e a idade da pessoa.
Esses diagnósticos são feitos através dos testes genéticos. Eles permitem a procura de alterações específicas no material genético e podem ser feitos pelo sangue, saliva ou outros tecidos. O teste é realizado em laboratórios especializados e os seus resultados devem ser avaliados por um geneticista, o profissional capacitado para tal atividade.
Quando procurar um geneticista
Devem se consultar com um geneticista os pacientes oncológicos com suspeita de uma síndrome de câncer hereditário e seus familiares que não tiveram câncer até o momento, pois eles correm o risco de serem portadores da síndrome. O ideal é sempre iniciar a investigação em um membro da família que tenha tido o diagnóstico de câncer, pois isso melhora a eficácia da investigação.
Infelizmente não é possível evitar o surgimento do câncer, mas em alguns casos é possível tomar medidas redutoras de risco, como a realização de algumas cirurgias. Além disso, a identificação precoce de um tumor melhora as chances de cura de um paciente, e isso sim é possível.
O que deve ser sempre encorajado são as medidas de mudança de vida que reduzem o risco para o aparecimento de câncer em qualquer um de nós, sendo ou não portadores de uma alteração genética, como evitar o tabagismo, praticar atividade física e ter cuidados com a alimentação.
*Por Ricardo Henrique Barbosa – Genticista do ICB